BELEM, terça-feira, 8 de maio de 2012 (ZENIT.org) – Publicamos a seguir o artigo de espiritualidade semanal enviado pelo nosso colaborador habitual, Dom Alberto Taveira Corrêa, arcebispo metropolitano de Belém do Pará, sobre o tema do Amor Cristão.
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Não existe uma pessoa que não ame. Muda o objeto que é amado, mas faz parte da natureza humana voltar-se, no amor, para o que é desejado e buscado. Pode parecer muito simples, mas também a capacidade de amar vem a ser educada, num processo de formação que envolve a vida inteira. Mal formada, a inata capacidade para amar pode chegar inclusive à destruição da realidade que é amada. Trata-se de uma força imensa, plantada por Deus nos corações humanos. Ela vem do Céu, para se implantar e multiplicar-se no bem que pode ser feito na terra e se perpetuará na eternidade.
O amor é um sentimento? Envolve, sim, os sentidos, mas na compreensão cristã, que perpassa a Sagrada Escritura e a experiência secular da Igreja, é muito mais do que um sentimento. Antes, é um ato de inteligência e de vontade. Basta recordar a realidade do martírio, presente em toda a história da Igreja, na qual alguém se dispõe a superar o instinto primordial de defesa da própria vida, para entregá-la pelo bem dos outros, como resultado de sua escolha de vida no seguimento do Evangelho. Existem também situações de pessoas que, mesmo sem conhecimento do Evangelho, chegam a entregar-se pelo bem dos outros, pela causa da vida e da dignidade humana. Tais gestos fazem compreender a possibilidade de uma escolha radical, que orienta todas as energias humanas para o que não se vê nem se pode comprovar, senão pelo testemunho!
“Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças. E trarás gravadas no teu coração todas estas palavras que hoje te ordeno. Tu as repetirás com insistência a teus filhos e delas falarás quando estiveres sentado em casa ou andando a caminho, quando te deitares ou te levantares” (Dt 6,4). A primeira e decisiva opção na vida há de ser esta, como uma veste interior, que envolve e orienta todas as outras decisões: escolher Deus como tudo da própria existência.
O resumo da lei de Deus, expressa o Decálogo, se encontra na lapidar afirmação: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Mas foram necessários muitos séculos e, mais do que tudo, a revelação que vem do alto, para que tal mandamento viesse a ser compreendido. Aliás, foi preciso que o Pai do Céu enviasse seu Filho, como vítima de reparação por nossos pecados, para a humanidade entender o amor (1 Jo 4,7-10) e sua medida, que é justamente amar sem medida.
O amor ao próximo suscitou muitas perguntas. Afinal, o próximo é quem está perto de mim? Para povos que vagavam por desertos ou se sentiam ameaçados pelos potenciais inimigos, o estrangeiro é também próximo? Como tratar quem é diferente e incomoda? Jesus Cristo, amor do Pai que se faz carne no meio da humanidade, aproxima o amor do próximo ao amor de Deus, dizendo que o segundo é semelhante ao primeiro mandamento! Próximo vem a ser, para o Senhor, aquele de quem nos aproximamos e não apenas quem vem pedir qualquer ajuda: “Na tua opinião – perguntou Jesus –, qual dos três foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?” Ele respondeu: “Aquele que usou de misericórdia para com ele”. Então Jesus lhe disse: “Vai e faze tu a mesma coisa” (Lc 10, 36-37). Conhecemos o verdadeiro Bom Samaritano, o próprio Jesus, que veio percorrer as estradas do mundo, tomando a iniciativa de vir em socorro da humanidade.
Mas Jesus guarda a pérola de seu amor a ser revelada no ambiente especial da última Ceia: “Este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei. Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15, 12-13). Aqui está um ponto de chegada, nascido do alto e que antecipa a realidade do Céu aqui na terra! Somos feitos para esta qualidade de amor!
Ainda que devamos amar a todos, sem distinção, cada cristão é chamado a ter um espaço de convivência, no qual possa declarar, com gestos e palavras, sua disposição para dar a vida e receber a vida doada. Nisto todos conhecerão que somos discípulos de Cristo (Jo 13,35). Pode ser a família, e quem dera que nossas famílias chegassem a esse ponto! Pode ser a experiência de uma Comunidade cristã viva, e para lá havemos de caminhar. Uma amizade sincera e pura proporciona esta declaração de amor. É uma potência indescritível de transformação da vida das pessoas. É necessário olhar ao nosso redor, pois existem, sim, pessoas, comunidades e grupos que oferecem este testemunho!
Nos mistérios da Páscoa, celebrados pela Igreja, Deus nos dá de presente esta capacidade de amar. De nossa parte, resta corresponder aos dons de Deus (Cf. Oração do dia do VI Domingo da Páscoa). Cada resposta e cada ato de amor a Deus e ao próximo contribuirão para que o mundo, sem deixar de ser mundo, seja mais parecido com o Céu!